Ao ler
um manual de medicina psiquiátrica, pude ter conhecimento de que tudo envolvido
a mente pode ser considerado químico. Aquele esquizofrênico da novela era
daquele jeito porque algumas sinapses em seus neurônios vinham com mais ou
menos do que deviam. Mas, como uma
sensação de dor no coração, ao lembrar de um passado distante, pode ser apenas
um conjunto de substancias químicas em falta ou em excesso?
A minha
saudade, eu sei, sinto, que não é só química. Pode ser que as lembranças pelas
quais eu sinta essa dorzinha sejam resultado de uma série de bombas de
potássio, entrando e saindo das minhas redes de neurônios para realizar a
sinapse das lembranças, mas as sensações que isso me traz
não são.
Vivemos
em um mundo cercado de questionamentos e sedento por respostas cada vez mais
exatas para aquilo que não passa de uma verdade interna e individual. O modo
como se vê um determinado evento é singular, e varia de pessoa para pessoa. O
problema está na generalização em massa em que vivemos, que afeta até nossos
sentimentos mais puros. Eles dizem que o amor é causa de excesso de ocitocina
no sangue, e que mulheres tendem a ter mais ocitocina que homens. Pergunto
então: é por isso que homem não chora? Por falta de ocitocina?
Dias
atrás queria fazer mais uma tatuagem. Em uma lista, vi uma estrutura química em
um braço, e a legenda era “a sensação de felicidade”. Confesso que fiquei com
vontade de tatuá-la, mas agora não faz sentido. Talvez Deus, em sua infinita
perfeição, criou algumas bases nitrogenadas para que nós as tatuemos no braço,
acreditando fielmente que poucos carbonos ligados à alguns nitrogênios são
responsáveis pela nossa felicidade.
Eu, que pretendo seguir carreira médica, me sinto um “ateu” ao discordar que esses
sentimentos e muitos outros são resultados de excesso ou falta de substancias
químicas. E mais: eu não me limito à essas pequenas reações. É muito mais que
isso.
É muito
mais que alguns carbonos e amônias: é a sensação se se sentir completo, com
vontade de esboçar um sorriso daqueles que seus olhos ficam esmagados. É aquela
vontade de sair pela rua rindo, mostrando seus dentes para qualquer um.
É muito
mais que excesso de ocitocina: é querer o bem de alguém. É querer adotar os
problemas de alguém e fazê-los seus. É querer sofrer para que alguém sorria.
Jesus não morreu por excesso de ocitocina, Buda não ficou sentado embaixo de
uma árvore por excesso de ocitocina, Maomé não peregrinava por excesso de
ocitocina.
Então,
como algo que eu sinto lembrando do passado pode se limitar a reações químicas?
Uma reação química que me faz querer construir uma máquina do tempo só para ter
o prazer de reviver meus 9, 10, 11 anos. De rever minha avó sentada numa
cadeira reclamando do cachorro. Voltar para a minha convicção de primeiro amor eterno,
e tantos outros... De voltar para me desculpar pelo o que eu vou dizer no
futuro, ou até mesmo evitar uma palavra mal intencionada... De reencontrar um
amigo antigo que a tempos não vejo, e aproveitar tudo outra vez, mas mais
intensamente... Química? Não.
É o
coração. Não o físico, o espiritual. Aquele que nem mesmo o gênio dos gênios
explica. Aquele papo de sopro vital, no início da química, faz muito sentido se
compararmos a teoria com esses eventos. Todos nós nascemos com uma alma, um
sopro vital. E este faz com que tenhamos esse tipo de pensamento inexplicável a
todo momento. Acredito nas cadeias carbônicas, nos compostos nitrogenados e nas
sinapses: eles são necessários para o funcionamento racional do nosso corpo, e
sanam as dúvidas de quem precisa de resposta para tudo.
Mas eu
acredito mais no que eu talvez não tenha conseguido explicar em todo esse
texto, mas que sem dúvida alguma é mais que químico.
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