terça-feira, 7 de abril de 2015

A geração anti-Babilônia

Ultimamente, tem muito se falado acerca do novo drama das 21h da Rede Globo, Babilônia. Escrita por Gilberto Braga, a novela aborda diversos temas sociais, como racismo, homossexualidade, a vida nas favelas e a corrupção na rotina dos brasileiros. Além desses temas polêmicos, Babilônia conta também com um elenco espetacular, com atores renomados, como Fernanda Montenegro, Camila Pitanga, Gloria Pires, Adriana Esteves e Marcos Pasquim.
O primeiro capítulo da novela assustou o público, contendo já de cara um beijo gay, que costumava ser colocado nos últimos capítulos, entre “duas senhoras de idade”. De um lado, internautas aplaudiram a atitude da emissora, exaltando-a por vencer a barreira do preconceito. Do outro, expectadores conservadores e religiosos, além da bancada evangélica cristã do senado, criticaram severamente a emissora, organizando um boicote a novela...

Foram vários os movimentos criados em rede sociais, estimulando os expectadores a desligarem a TV durante a novela, defendendo que a mesma destruía os valores da família, além de expor cenas pesadas para a faixa etária de 14 anos. Por incrível que pareça, os movimentos parecem ter atingido seu objetivo.
Babilônia, apesar de estar em primeiro lugar, vem caindo em pontos de audiência. O de costume, 40/45, ficou distante dos 18.5 alcançados no dia 04/04 (sábado). A novela está passando por um pente fino. A personagem de Sophie Charlotte, que estava cotada para ser uma prostituta, será a nova mocinha da novela, enquanto Camila Pitanga, que não agradou muito o público, será deixada em segundo plano. Essa, e várias outras mudanças, serão feitas para que não haja prejuízos até o final da novela, já que o investimento foi grandioso.

Um dos cartazes de repúdio a novela de Gilberto Braga
Foto: um dos cartazes de repúdio à novela de Gilberto Braga
Realmente, a novela está “pesada”. Tive a oportunidade de assistir dois capítulos e tenho que admitir que a trama foca bastante na questão do sexo e na “falcatrua” humana. Talvez, esse seja o motivo pelo qual a sociedade rejeitou Babilônia: por tocar na ferida da rotina brasileira. Apesar de ser uma novela, a história não tem muita diferença com a vida de muita gente.
A promiscuidade e a prostituição é a realidade de um grande número de brasileiros, julgados e excluídos por uma sociedade que sonha com a utopia de “final feliz”, excluindo qualquer tipo de ferida que o mundo tem. As pessoas preferem acreditar que o que a novela retrata não existe, que o que se vê nas ruas são “mulheres sem-vergonha, que se quisessem, arranjariam um emprego”. A utopia conservadora veta o drama de pessoas assim, e preferem ver uma mocinha rica sofrendo de amor.
Foi-se o tempo em que as novelas serviam para mexer com a imaginação das pessoas. Agora, muito mais que uma produção artística, as novelas retratam a realidade de pessoas, e no caso das prostitutas, as vítimas dos “finais felizes”. Não pense que, exibindo os mecanismos da prostituição, a obra estimula essa via de dinheiro “fácil”. Pelo contrário, a exposição da ferida ajuda na cura. Porém, muitos não enxergam por esse lado, e o que se vê hoje em dia é aversão por esse tipo de história.
Além da prostituição, a homossexualidade ganhou espaço na novela, dessa vez com dois casais. Fernanda Montenegro e Nathalia Timberg, ambas na casa dos 80, causaram, sem dúvida alguma, um alvoroço imenso, tanto no público pró, como no contra. O casal protagonizado pelas duas é sempre flagrado em momentos carinhosos e íntimos, o que causa repugno aos expectadores conservadores. Não há muito o que falar sobre esse assunto, uma vez que todos nós temos o direito de escolher do que gostar e do que não gostar. O cidadão tem todo o direito de não gostar de presenciar cenas de afeto entre pessoas do mesmo sexo, mas, é obrigado a respeitar. Expor isso em uma novela deixou de ser tabu há muito tempo, porém, por conta da idade das atrizes, pessoas por todo o país defendem que os princípios da família estão sendo corrompidos. Minha avó, por exemplo, não gosta muito desse tipo de cena, ainda mais com atrizes “da época dela”, porém, posso garantir que, ao assistir o beijo entre as velhinhas, ela não virou gay.
Outra personagem que está dando o que falar é a da atriz Adriana Esteves, a eterna Carminha, que, juntamente com outra personagem polêmica, protagonizada por Glória Pires, vem se tornando uma figura corrupta, que coloca a ganância em primeiro plano e faz de tudo para conseguir seus objetivos. A vingança é, também, palavra-chave entre essas duas.
Talvez, os outros pontos que eu comentei sejam, na minha visão, mais “compreensíveis” que esse. Não dá pra entender o brasileiro, que faz alarde em redes sociais contra a sujeira do governo, que sai nas ruas pra protestar para contra uma possível ditadura, que tira a roupa para protestar contra a corrupção, mas que reclama quando toda essa falcatrua é exibida no horário nobre.
Sinceramente? Hipocrisia define toda essa aversão vivida. A maioria das pessoas prefere fechar os olhos para a novela, achando que ela “exagera” nas exibições, mas presencia e, em muitos dos casos, faz pior na vida real. Me desculpem, mas eu chego a enjoar com algumas pessoas que defendem o boicote de uma ferramenta que serve para abrir os olhos da população, já que o jornalismo da emissora não é lá grande coisa.
Dizem que novela se chama Babilônia justamente porque reflete os textos bíblicos, que citam a cidade como "BABILÔNIA, A GRANDE, A MÃE DAS MERETRIZES E DAS ABOMINAÇÕES DA TERRA". Se a própria Bíblia cita as perdições de uma cidade assim, não como forma de estimular ações pecaminosas, mas para dar um exemplo a não ser seguido, qual o problema de ver esse exemplo sair das Escrituras Sagradas para entrar na TV?
Defendo, sim, uma reformulação nas cenas de sexo, uma apropriação para a faixa etária anunciada, mas o roteiro original deve continuar intacto, como forma de mostrar as pessoas o que acontece nas vidas de muitas outras pelo país, que são rejeitadas de nossa utopia. Elas também querem ter um final feliz, mas não podem, porque a história delas "corrompe os valores familiares."   
 Fechar os olhos para realidade é colaborar com injustiças sociais vivenciadas hoje em dia. Antes de estimular um boicote, pense se sua vida, suas atitudes, seu jeito de ser no dia-a-dia, seria apropriado para a exibição no horário nobre.

Um comentário:

  1. Parabéns, Murilo! Imagino que você tenha seus 18 ou 19 anos, e já está maduro e tem opinião formada. Sabe muito bem defender seu ponto de vista, apresentar seus argumentos e dissertar sobre cada um deles, qualidade rara entre os jovens de hoje em dia. Você deveria investir nesse talento, rapaz!

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